19.3.07

Da miserável obrigação de votar

A contrariedade humana é de fato explícita e inegável. Machado de Assis, em meio a todo seu pessimismo, conseguiu resumi-la bem em seu conto "A Igreja do Diabo". Nele, em suma, o Diabo após longos e repetitivos discursos, consegue que Deus se aborreça e o mande de volta para a Terra. O Diabo, sem perder tempo, reúne o maior número de pecadores e viciados e começa a pregar uma doutrina que vem de todo contra os princípios católicos e logo consegue muitos adeptos. Com a liberdade para cometer-se pecados, começa-se a notar a proibição implícita da bondade, e como toda proibição só serve de estímulo para ações, logo muitos voltavam a ser fiéis a Deus. O Diabo, decepcionado com seu fracasso, volta-se para Deus que o consola dizendo que esta seria "a eterna contradição humana".

A obrigação de votar tem sido alvo de discussões. Um Estado que se diz democrático, não deve impor a sua população direitos, mas sim colocá-los a sua disposição. Não será um cidadão tirado forçosamente do conforto de seu lar que elegerá nosso melhor representante. Pode-se obrigá-lo a ir até sua zona eleitoral, até sua urna, mas não se pode obrigá-lo a votar com plena consciência de cidadania, por mais que sejam feitas ações afirmativas nesse sentido. A extinção do voto obrigatório só levaria uma população mais conscientizada às urnas, somente aqueles que de fato desejam exercer seu direito de cidadania. Como relata o conto machadiano, proibições, tanto quanto imposições, só estimulam ações negativas e contrárias em relação ao que se quer atingir.

Há uma corrente que acredita e teme que haveriam mais votos comprados, mas quem compra voto, continuará comprando, e provavelmente teriam de pagar ainda mais para tirar um cidadão da inebriante sensação de estar em casa após uma semana inteira trabalhada. Faço deste medo a idéia de bobo e prematuro.

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