6.1.08

Circunflexo

Quando a massa corporal dele, aspecto que afirmava a sua existência perante as outras coisas, se redimiu do efeito humano involuntário de caminhar, seu cerebelo deu início à liberação das enzimas e impulsos nervosos que deveriam culminar numa resposta, motivo ou explicação; mas em seu caso culminou em nada.
O mundo não cessou o castigo sobre aquele corpo - agora circunflexo em dor, derrota, e dúvida - só pelo fato d’ele se encontrar com respiração arquejante causada pela árdua busca de uma simples resposta. Cenário fatigante.
Suas pernas flexionadas em contato com o chão não sairiam daquela posição tão cedo. E seria melhor que aquele corpo masculino aprendesse a rastejar com as mãos em contato com o solo, breve. Seria essa a única forma de continuar sua jornada: arrastando-se na mesma altura dos artrópodes mais repulsivos e mais primários. É bom que ele aprendesse a olhar na mesma altura, arrastar-se pelas mesmas vielas. Seria bom que ele aprendesse a enxergar as outras formas de vida desprezadas por suas prioridades de outrora.
Seu corpo não se move mais em simetria ereta. Agora ele se mistura com a rotidão do solo e das coisas podres ou inúteis deixadas para trás. Agora seu corpo faz parte – quase como se fosse – do mundo. Seu corpo pertence integralmente ao piso terrestre. Antes, se punha na horizontal somente se fosse sobre pedaços de madeira de forma que ficasse suspenso e não entrasse em contato com seu soalho, à noite. Agora soalho é sua mais confortável cama.
E seu caminho é empoeirado.
Nunca antes tinha reparado como as ruas são imundas.
Nunca antes tinha reparado nessa imundície toda.
Que mundo imundo.

2 comentários:

gustavo disse...

Sabe de uma coisa? Elogiar por blog o que você escreve é mais fácil que por orkut. Então é por aqui que eu vou mandar recados a partir de agora.
Gostei do conto mas tem 'issís'. E se, partindo pro final, fosse ficando mais e mais escatológico, degradante? E se os cinco últimos parágrafos fossem um só? Apenas sugestões...

Ah o título é muito instigante! ;)

Carmim disse...

Passando para desejar um óptimo ano novo. Que 2008 seja um ano de muita luz e sorrisos.

Informo que provavelmente mudarei de casa. O Girassol continua "no ar", mas deixo o endereço do novo refúgio:

www.vivovermelho.blogspot.com

Beijos.