Um dia, quando o esforço me for conveniente, tentarei achar a razão de tudo ter acontecido dessa maneira.
No momento, a masturbação mental não me convém, até porque uma resposta agora poderia não cair muito bem, e nem sal de frutas ou medicamento semelhante seria capaz de dissolver tal mal-estar causado.
Você arqueava minhas sobrancelhas com as pontas dos dedos, deslizando delicada e suavemente em torno delas, desenhando seu formato, com movimentos tão ingentes que poderiam estar contornando os próprios arcos da Lapa. Observava-me com a cara do bobo mais apaixonado. Do bobo verdadeiramente bobo, do bobo de Lispector.
Enquanto isso eu me perdia em torno de um pensamento raso, acerca de uma dúvida que contraíra de manhã ao ouvir um repórter pronunciar a palavra ‘padrofobo’, quando na verdade eu pensava que deveria ser padrófobo (o que se diz de uma pessoa que tem pavor a padres ou sacerdotes). Descobrir a tonicidade certa daquela palavra - se era paraxítona ou proparoxítona – parecia realmente importante para mim. Tal dúvida causava em mim um fidedigno rebuliço mental. Na verdade eu nem sabia direito do que se tratava um padrófobo, ou padrofobo (segundo o repórter) na hora em que o mesmo mencionou a causa de minha atual desgraça, mas a grafia correta e conseqüente pronúncia fiel da palavra era algo que me deixava inquieta.
Você acariciava meus cabelos curtos, aprazido de sua maciez descomunal, e eu, no meu silêncio, ansiava por um dicionário, pela simetria das páginas brancas, que pudessem pôr fim à minha aflitiva dúvida, que consistia na existência de um mísero acento e na mudança radical da pronúncia de uma palavra que talvez eu nem viesse a mencionar outra vez na vida.
Naquela noite, nem toda a bebida pôde me distrair da gramática normativa que aprendera a amar na escola. Um acento seria decisivo num duelo (existente somente em minha cabeça) entre mim e o repórter. A perda daquele duelo seria um desagravo seríssimo contra a minha honra. Honra que adquiri durante anos, sugando aquela gramática azul e remendada que sempre foi a minha preferida.
Sobre as horas seguintes, sinceramente eu não saberia responder. Nada mais vi ou senti, mergulhada num egoísmo fútil causado pelos meus agoniados neurônios. Só sei que devo ter permanecido ali quieta, incólume, impávida e colosso; enquanto você me amou perdidamente.
9 comentários:
a palavra AMOR ficou banalizada demais. FATO.
brigadinho pela visita ao meu blog.
bjo =)
"Só sei que devo ter permanecido ali quieta, incólume, impávida e colosso; enquanto você me amou perdidamente."
O que me surpreende em mim mesma é que, às vezes, só me interesso por uma frase em todo o post.
Parabéns.
Esse lugar é muito bonito moça.
Obrigada pela visita;)
Incrível seu post!
Sabe que às vezes acontece algo parecido comigo?
Claro que não nessa proporção de não prestar atenção ao amor, mas muitas vezes quero lembrar de algo e quando não consigo, aquilo fica martelando até conseguir.
Beijos
Receber elogios é bom,
Receber elogios de alguém tem um blog como este é uma honra.
Obrigado.
Post bem encaixadinho, muito legal, irei ler outros.
Ô Gina...tadinho dele. Tudo por conta de sua avidez literária...rsrs.
Bom texto.
Bjs.
Eu também sou assim... Fico procurando erros em placas na rua, nas palavras de alguém da tv, até mesmo nos discursos dos professores...
Heheheh
Adorei vir aqui!!
Nem adianta fechar a porta que eu volto hein??
=]
Beijos!
Prometo que essa noite o amor vai ser o único tema que não haverá no meu repertório...
Nele, só caberão elogios ao teu texto, da linguagem que vc utilizou pra se expressar, e da tua profundidade com elas, as tão desejadas palavras...
Beijos, and...
Muito obrigado ,vamos almoçar
Meu Deus, que final!
E porque não? Também temos o direito de usa-los de vez em quando,rs.
Assim eu interpretei e achei fantástico.
Beijo!
amor à palavra,
desamor ao amante,
nem perdidamente
o bastante
nem instante,
porque por horas
nem padre ora
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